O projeto de lei complementar que reduz benefícios tributários em 10%, enviado pelo governo ao Congresso na semana passada para fechar as contas do Orçamento de 2026, cita nominalmente algumas renúncias que seriam atingidas pela medida.
Entre elas está o regime de tributação do lucro presumido, adotado normalmente por empresas com faturamento anual acima do limite do Simples Nacional (R$ 4,8 milhões) e de até R$ 78 milhões, patamar das grandes empresas do lucro real.
Também estão no texto a desoneração da folha de pagamento; o Reiq (Regime Especial da Indústria Química); e benefícios de PIS/Cofins para insumos agropecuários e nafta destinada à produção de gasolina e diesel.
São citados ainda a redução de créditos tributários para os segmentos de veículos, tratores, máquinas agrícolas, atividades agropecuárias, biodiesel, medicamentos e transporte rodoviário, segundo levantamento feito pelo escritório Bichara Advogados.
O projeto (PLP 182/2025) também diz que serão atingidos os incentivos listados no Demonstrativo de Gastos Tributários da Receita Federal. Isso pode atingir benefícios a empresas ligados a planos de saúde, planos de previdência e vale alimentação para empregados, segundo o escritório.
Ficam de fora os benefícios voltados diretamente a pessoas físicas, como as deduções e isenções do Imposto de Renda, além do Simples Nacional, dos incentivos da Zona Franca de Manaus e do programa automotivo Mover. A alíquota zero de PIS/Cofins para itens da cesta básica também está mantida, assim como as imunidades tributárias previstas na Constituição.
Para os impostos, o aumento da carga valeria a partir de janeiro de 2026. Para as contribuições, o prazo é de 90 dias após a aprovação do texto.
Folha Mercado
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A forma de aplicação do corte varia. Programas com isenção e alíquota zero passam a ser tributados em 10% dos tributos correspondentes. Os créditos tributários ficam limitados a 90% do seu valor.
No caso do lucro presumido, os chamados “percentuais de presunção” ficam acrescidos em 10%. Esse regime prevê uma tributação simplificada para determinar a base de cálculo do IRPJ (Imposto de Renda Pessoa Jurídica) e da CSLL (Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido).
Vinicius Vicentin Caccavali, sócio da área de tributário do VBSO, explica que a modificação proposta pelo governo aumenta em 10% o percentual de presunção sobre a parcela da receita bruta total que exceder o valor de R$ 1,2 milhão no ano.
Atualmente, no setor de serviços, presume-se como lucro o equivalente a 32% da receita bruta. Com a mudança, seriam 35,2% (110% de 32%). Para a compra e venda de mercadorias, e diversos outros setores, o aumento seria de 8% para 8,8% no IRPJ e de 12% para 13,2% na CSLL.
Segundo Caccavali, uma empresa prestadora de serviços com receita de R$ 10 milhões no ano passaria a pagar o equivalente a 11,59% da sua receita bruta, em comparação aos 10,82% atuais. Quanto maior a receita bruta, maior seria o impacto, considerando o corte de R$ 1,2 milhão.
“Essa medida reacende discussões sobre o fato de o lucro presumido poder ser enquadrado como benefício fiscal e não como regime de apuração, o que deve levar a debates no Congresso quanto à viabilidade da proposta do governo”, afirma Caccavali.
O tributarista Raul Iberê Malagó, sócio do M&A Law, diz que os setores mais afetados por essa medida são aqueles com maior concentração de empresas no lucro presumido, como os de serviços em geral, tecnologia, consultoria e intermediação de negócios.
Para ele, o aumento da carga pode levar a uma reavaliação do planejamento tributário por parte dessas empresas, que poderão, inclusive, considerar a migração para o regime de lucro real, a depender de sua estrutura de custos e margens de lucro.
“É fundamental que o debate sobre essa proposta seja aprofundado, considerando os potenciais impactos na competitividade das empresas, na geração de empregos e no ambiente de negócios como um todo. A medida, se aprovada, exigirá das empresas uma análise cuidadosa de seus números e um planejamento tributário ainda mais estratégico para mitigar os efeitos do aumento da tributação.”
Há dúvidas sobre o futuro da proposta no Congresso. O governo havia desistido de encaminhar um projeto próprio para cortar benefícios fiscais, mas foi obrigado a fazer isso para incluir o valor do corte de renúncias no Orçamento de 2026, enviado no mesmo dia ao Congresso.
A medida, defendida pelo Ministério da Fazenda, vinha sendo discutida no âmbito de um projeto já em tramitação na Câmara, sob relatoria do deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB). O parlamentar ainda não apresentou seu parecer e, sem isso, o governo não poderia incluir os impactos esperados no Orçamento.
Fonte ==> Folha SP