Em defesa do Marco Civil da Internet Brasileira: uma conquista democrática sob ameaça

Em defesa do Marco Civil da Internet Brasileira: uma conquista democrática sob ameaça

O Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965/2014) representa uma das legislações mais avançadas do mundo no que diz respeito à regulação da internet sob os pilares da liberdade de expressão, da proteção à privacidade e da neutralidade da rede. Fruto de um amplo processo participativo envolvendo sociedade civil, academia, setor privado e governo, essa legislação consagrou direitos fundamentais e estabeleceu balizas claras para o funcionamento da internet no Brasil. Entretanto, apesar de sua relevância, o Marco Civil tem sido alvo de tentativas recorrentes de flexibilização e esvaziamento, geralmente impulsionadas por interesses econômicos ou políticos alheios ao bem coletivo.

Em termos críticos, é fundamental reconhecer que o Marco Civil não é apenas uma norma técnica, mas um instrumento político de proteção da cidadania digital. Ele garantiu, por exemplo, que os dados dos usuários não pudessem ser utilizados indiscriminadamente por empresas de tecnologia, colocando freios no avanço da vigilância digital e no uso abusivo de informações pessoais. Em um cenário de avanço das big techs e da coleta massiva de dados, essa proteção é cada vez mais essencial.

Outro ponto central da lei é a neutralidade da rede, que assegura que todos os dados que circulam na internet sejam tratados de forma isonômica, sem discriminação por conteúdo, origem ou destino. Esse princípio impede que operadoras de telecomunicações cobrem mais por determinados serviços ou privilegiem seus próprios conteúdos em detrimento de concorrentes ou de iniciativas independentes. A neutralidade é a espinha dorsal de uma internet aberta, plural e inovadora — e sua preservação é um dos legados mais importantes do Marco Civil.

Críticas ao Marco Civil costumam vir de setores que desejam maior controle sobre o fluxo de informações online, seja por motivos políticos — como a regulação de discursos —, seja por motivos econômicos, como a fragmentação da internet por pacotes de dados discriminatórios. Essas pressões, embora travestidas de modernização ou combate às fake news, muitas vezes abrem caminho para a censura, o monopólio informacional e a vigilância de Estado.

Contudo, é legítimo admitir que o Marco Civil precisa ser atualizado e complementado, especialmente diante de desafios como a desinformação em massa, o uso de inteligência artificial e o crescimento das plataformas digitais como atores reguladores de fato. A resposta a esses desafios, porém, deve seguir a mesma lógica democrática que deu origem à lei: diálogo público, transparência e respeito aos direitos fundamentais. Qualquer tentativa de mudança que busque atalhos autoritários ou retrocessos em nome da governabilidade digital deve ser veementemente rechaçada.

Em suma, defender o Marco Civil da Internet é defender o próprio projeto de uma internet livre, plural e voltada ao interesse público. Sua existência é um marco não apenas jurídico, mas simbólico: mostra que é possível regular o espaço digital sem abrir mão da democracia. Em tempos de retrocessos e disputas narrativas, reafirmar os princípios do Marco Civil é mais do que necessário — é um ato de resistência.



Fonte ==> Portal Da Ilha

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